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Caderno D

Irene Ravache fala sobre sua personagem

24 outubro 2015 - 07h00

Aos 71 anos e com 50 de carreira na TV, Irene Ravache acredita estar vivendo seu maior desafio nessas cinco décadas de trabalho em novelas, séries e minisséries. Por mais de 80 capítulos de “Além do Tempo” encarnou uma condessa do século XIX autoritária e disposta a qualquer coisa para fazer prevalecer sua vontade. E agora vive uma Vitória que tem a mesma essência daquela de época, mas em outro contexto e situação financeira. Uma mudança já planejada desde o início do projeto, mas feita no cronograma industrial de uma novela. “De cara, assim que soube como seria, me deu muita vontade de fazer. Essa ousadia de mexer na história inteira tira a gente da zona de conforto e nos estimula artisticamente”, avalia. Nesta entrevista, Irene fala mais sobre a mudança e como lida com a forte carga dramática de seu texto na novela de Elizabeth Jhin. Desde o início você garantiu que só ia ler a sinopse da segunda fase quando já estivesse começando a trabalhar em cima dela. Conseguiu cumprir sua palavra? Irene Ravache - Sim. E foi a melhor coisa que eu fiz! Só fui olhar semanas antes de gravar. Tinha de aguentar a curiosidade, achava importante para cumprir bem a primeira fase. Nesse período, algumas informações foram publicadas. Foi difícil se manter alheia a esses spoilers? Irene - Olha, alguns colegas até começavam a falar. Eu prontamente pedia que parassem, porque eu não queria mesmo saber Só que chegou um dia em que a equipe de figurino precisou conversar comigo sobre essa nova Vitória e aí não teve jeito. Estava na hora de mexer naquele envelopinho que estava fechado. Mas isso aconteceu semanas antes de começar a gravar. Como você encarou essa hora? Irene - É claro que eu sinto falta dos cenários, roupas e relações dos personagens da primeira fase. Mas acho essa virada interessantíssima. Arrisco dizer que deve ser o maior desafio pelo qual esse grupo inteiro passou. E não me refiro apenas ao elenco, direção e autores, mas também ao pessoal da arte, figurino, cenografia, enfim, todo mundo. Saímos de algo que dava muito certo em audiência e em crítica para o incerto. Navegávamos em um mar calmo e fomos nos aventurar em outra rota, onde poderemos ter tempo bom ou não. A novela discute o que podemos levar de uma vida para a outra. Neste sentido, que mensagem a Vitória vai passar para o público? Irene - Ela perdeu um filho vivo na primeira etapa e na segunda também, porque desconhece a filha. E isso é bem pesado. Acho que a Vitória acaba propondo uma reflexão sobre as coisas que não resolvemos e que podem se repetir em outras etapas. Ninguém deve esperar ficar velho, à beira da morte, para enfrentar alguns problemas. Vamos tentar solucionar tudo enquanto dá. Se o outro lado não quiser, pelo menos a gente fez a nossa parte. Você disse que começou a ler a segunda fase por causa do figurino. O que muda nos trajes da Vitória? Irene - O figurino é de uma pessoa que teve boa vida, mas não tem mais. Não há nada novo. Vitória usa uma joia no pescoço, que ela nem tira. Nas roupas, por exemplo, ela tem um blazer assinado pelo Giorgio Armani, mas é de 1980. Tudo de grife que ela mantém não é moderno, porque já há algum tempo não sobra dinheiro para esses luxos. A carga dramática de suas sequências como Vitória era bem intensa na fase de época. Era difícil para você chegar e sair desse grau de emoção? Irene - Eu penso muito na cena até fazer. A gente se envolve muito, até porque tem o momento de ler a primeira vez, decorar, passar o texto com o colega... Só que é tudo visto de uma forma inclusive muito fria. O iluminador pede para você ficar parado num determinado ponto porque é melhor de luz, por exemplo. E então você precisa também estar concentrado para executar aquilo A emoção vem na hora de fazer. E termina exatamente quando acaba. Claro que se é algo muito pesado, alguém me traz um lenço, eu enxugo as lágrimas e dou um tempinho para me recompor. Mas é tempinho mesmo, você conta até dez e vai embora. Não é uma sessão espírita. Quando a novela estreou, você disse que esperava que Vitória fosse odiada pelo público, mas isso não aconteceu. Foi uma surpresa? Irene - Acho que isso aconteceu porque fiz uma Vitória com os dois lados. Ela manda queimar uma casa, mas sofre pela ausência do filho, então as pessoas sentiam um misto de raiva e compaixão por ela. O público foi envelhecendo e se acostumando a separar o ator dos personagens. Todo mundo que conversa comigo primeiro me parabeniza e só depois fala de trama.

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