A arte cênica não faz parte da liturgia da Igreja, pelo menos não faz parte da Missa.
O mistério do sacrifício de Cristo e da Ceia Pascal é ação divina intermediada pela participação da Igreja, que autoriza não os atores, mas sacerdotes e ministros a celebrar os mistérios sagrados.
Porém, a criatividade popular valoriza muito a arte cênica dentro e fora da Igreja.
Crianças, adolescentes, jovens, adultos exibem-se com poesia, música, dança, artes figurativas e cênicas, por fins espirituais e estéticos, diversamente das outras artes que fixam para si, fins de utilidade comercial ou exclusivamente artística, técnica, artesã e produtiva.
Há artistas que apresentam os mistérios sagrados, depois de uma séria preparação espiritual e começam o canto ou a encenação, invocando a divindade inspiradora.
Nos artistas, que apresentam cenas sacras, acontece uma catarse psicodramática litúrgica, quase um despojamento total da matéria para calar-se numa experiência mística e divina. No livro “Memórias de Suzano", no capítulo que fala da Capela de São Sebastião do Guaió, encontra-se uma foto de 1970.
Registra a participação do advogado José Felipe da Silva na encenação religiosa de Sexta Feira Santa. Ele carrega a cruz até encenar a crucifixão e a sepultura. Havia vários atores nesta apresentação, entre eles Sebastião Cardoso na parte de Pôncio Pilatos e Augusto da Silva que estava vestido de soldado.
Estes atores não interpretam apenas fatos acontecidos no passado, mas pela fé eles procuram alcançar uma comunhão vital com a obra-mestra de Deus que em Jesus Cristo realizou seu eterno plano de salvação.
Por isso não pode faltar no seio da comunidade cristã espaço para os artistas, que historiam as obras de Deus e as anunciam à sua época.
Por conseguinte o artista é querigmático, aquele que anuncia a mensagem cristã buscando despertar no outro a fé. As encenações sagradas são verdadeiras catequeses. Já assistimos a grandes, belas e sacras obras cênicas de indiscutível valor catequético. Uma melodia sacra, um filme bem feito, uma página do Evangelho encenada podem provocar uma metanoia evangélica e uma transformação espiritual.
Mesmo admitindo que o simples relato do Evangelho tenha efeito profundamente interior, vale a pena reconhecer que apresentado a vida de Cristo e dos Santos através de categorias artísticas e lúdicas, é possível que a mensagem de Cristo, sua vida e suas obras, sejam entendidas mais a fundo. No jogo da criação artística, anuncia-se o querigma, isto é a ação divina em favor do seu povo, amado e resgatado do pecado e da morte pela obra salvífica de Cristo. Aos artistas compete a responsabilidade de valorizar a beleza das obras divinas contidas na Sagrada Escritura, apresentando-as com nova luz.
Talvez ao ouvir a Palavra de Deus, alguns fazem de conta que não ouviram ou não entenderam nada, porém ao apresentar cenas bíblicas é possível que também os cegos enxerguem. O palco sempre foi um espaço necessário para apresentar os dramas da vida cotidiana ou as situações críticas em que se encontram muitas pessoas e famílias.
Por isso a Igreja deseja apresentar a vida de Cristo e dos Santos através do ritual litúrgico e artístico, para que as novas gerações seduzidas pela cultura da imagem e avessas à escuta e ao diálogo, possam manter o seu conhecimento cristão através da arte.