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Jornal Diário de Suzano - 25/04/2024
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Coluna

Perguntas?

04 novembro 2017 - 05h00
Estava lendo uns textos sobre a vida dos idosos. E umas questões me foram vindo. Com o envelhecimento rápido dos brasileiros, será que estamos preparados para isso? E se vivemos mais tempo estamos preparados também para isso?
E foi inevitável dirigir-me algumas dessas questões. Por que não me preparei para a aposentadoria? Seguramente temos uma bruta queda de renda. E os gastos são bem maiores. Resultando um pouco (ou muito) mais pressão sobre nossa cabeça. Mas, vamos lá, essa tal de aposentadoria, na verdade, é mesmo só parar de ter emprego. Exato, só isso. E quem tem várias atividades, assim como eu, não para, de verdade, de trabalhar. Mas emprego e trabalho são coisas diversas. Entenda esse exemplo, eu não tenho emprego mas não para meu trabalho. E preciso trabalhar. E nem penso, nem quero parar. Ainda que todo trabalho não seja para remuneração. Por vezes, assim acredito, sinto assim, temos de executar uma ação voluntária solidária, filantrópica. Pensem nisso!
Mas as questões me vinham.
Olhei na prateleira, lá estava o querido volume. Peguei o "Livro das Perguntas", uma bela obra poética do ilustre Pablo Neruda. Tenho uma edição bilíngue, com tradução de Olga Savary, de 1983. É uma publicação póstuma. Abri aleatoriamente. Caiu-me assim: "Que suaves sílabas repete/ o ar da aurora marinha?" O Poeta me surpreende. E eu lá, olhando para o céu. Feriadão! Com esse tempo? O que faço? Corro para ver o mar? Me arrisco entre uma nuvem, uma chuva e um cinza a tudo encobrindo?
Vou pegar a estrada? Me aquieto por aqui? 
E quem iria me responder? Senão eu mesmo?
Sei lá, estava assim, desse jeito, levando meus pensamentos adiante. Neruda, de há muito nesta minha estranha vida, é um mestre do verso. Um Mestre! Na minha parede tem o quadro com seus versos por ele mesmo desenhados, que trouxe há uns tantos tempos da casa dele em Isla Negra: "Yo cambio la primavera porque tu me sigas mirando". Algo mais ou menos assim nesta minha língua: "Eu mudo a primavera porque tu continuas a me olhar". E não é mesmo assim? 
A Sarah Vaughan canta enquanto escrevo. E lado a lado me envolvem ela e Neruda. E lávem a "September Song", de Kurt Weill e Maxwell Anderson: "But the days grow short when you reach September". Sei lá, ela canto o outono, quando no Hemisfério Norte "os dias vão encurtando ao chegar setembro". Mudamos o horário para alongar os dias. Será que conseguimos? Ou mudo a música para "April in Paris"?
Abro mais uma página do livro. Choco-me com mais uma questão. Sei que é primavera, aqui pelo Hemisfério Sul. Mas o tal de "El Niño" bagunçou tudo. E o Poeta mais uma vez me interroga uma página adiante. E lá ele se me oferece algo mais. Saberei responder? Ou repetirei com ele: "Entra o outono legalmente/ ou é uma estação clandestina?" 
Quando nos interrogamos fica difícil parar. Os sonhos continuam. Neruda me responde com nova questão: "Onde encontrar um sino/ que soe dentro de teus sonhos?"