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Jornal Diário de Suzano - 24/04/2024
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Coluna

Português residente em Suzano encontra em Lisboa os companheiros da Guerra na África

24 maio 2018 - 23h59
Muitos soldados portugueses participaram da Guerra na África entre 1961 e 1974. Alguns deles, uns sessenta, costumam se encontrar uma vez por ano em Lisboa, para comemorar o tão desejado retorno na própria pátria, acontecido logo que terminou a guerra. Também Luciano de Abreu, nascido na Ilha da Madeira e hoje residente em Suzano, esteve na guerra da África. Dele ouvi o relato sobre o confronto das forças portuguesas contra os movimentos revolucionarias existentes em alguns países africanos. Para o Portugal, a guerra sustentava-se pela responsabilidade que o país tinha na manutenção da soberania sobre os vastos territórios coloniais, baseando-se ideologicamente num conceito de nação pluricontinental e multi-racial.
Pelo outro lado, havia nas colônias portuguesas, movimentos de libertação que justificavam a luta armada contra o domínio português com base no princípio inalienável de independência.
A guerra da África terminou quando houve no Portugal, em 1974, a mudança do rumo político do país e o empenhamento militar das forças armadas portuguesas nos teatros de operações deixou de fazer sentido. Os dirigentes do novo governo português anunciaram a democratização das colônias do Moçambique e da Angola e se predispuseram a aceitar as reivindicações de independência das colónias. Há alguns anos, entre maio e junho, Luciano viaja de Suzano a Lisboa para encontrar os soldados que com ele estavam em Moçambique durante a guerra colonial. Ninguém carrega mais o medo pelo perigo das armas de fogo, mas com os olhos e os rostos suavemente sorridentes, os ex-combatentes lembram, fatos, perigos, esconderijos, pontes, mortos e sobreviventes à guerra. Era a época da colonização e muitos países da Europa tentavam colonizar a África, introduzindo a cultura, o idioma e instalando um governo mantido por cidadãos europeus.
As lembranças dos dias da guerra acompanham a comemoração realizada em Lisboa dos ex-combatentes, com um ritual bem descontraído realizado num restaurante, brindando à amizade e à sorte de continuarem vivos. Entre os ex-combatentes há também, conforme o relato de Luciano, quem estava no comando militar, propondo o ataque ou a resistência no confronto com os movimentos revolucionários. O soldado Luciano já empunhou uma metralhadora na Guerra da África. Já esteve no meio de soldados caídos no combate. Abandonou o Moçambique antes que terminasse a guerra, à causa da sua esposa Maria Cildina que como uma "garibaldina" queria combater ao lado do marido. Com profunda emoção Luciano quis pôr um limite à coragem e ao heroísmo da esposa, recém casada e que havia deixado a Ilha da Madeira para estar com o marido no Moçambique. Considerando-a o bem maior e soberano e não querendo pôr em perigo a vida dela, a trouxe ao Brasil enfrentando a travessia do Oceano Atlântico. Ficou animado mas também intrigado, porque não foi uma mudança de emigrante mas de desertor. Chegou ao Brasil com pouco dinheiro no bolso. Trabalhou e se tornou dono de um açougue em Itaquaquecetuba e hoje é um pequeno empresário em Suzano. É de se maravilhar pela enorme coragem de dona Cildina. A ela, falecida em 2003, vai a minha homenagem neste texto que publico às vésperas da viagem de Luciano à Lisboa. A ele devo a honra de ser convidado a amassar a uva na sua casa, tomar um vinho excelente e ouvir a história que acabei de contar.