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Coluna

Os Sonhos da Poesia

07 fevereiro 2020 - 23h59
Como negar? De há muito leio muito e escrevo muito o que sinto e penso. E como também não reconhecer que isso de usar metáforas, ou seja, usar uma expressão para dizer uma outra coisa, é um recurso de Escritor, de Poeta, que só algumas vezes é entendido como lá no fundo se pretendeu dizer.
Uma vez num Congresso de Literatura disse que o Autor tenta sempre dizer o que sente ou pensa quando escreve. Mas só o leitor pode dizer se conseguiu ou não. Claro, num relato científico, num texto jurídico, num laudo médico, por exemplo, não se usa, ou não se deve usar, metáforas. É diferente.
Sempre fui cheio de sonhos. Quem não é, será que vive?
Estava pensando nisso enquanto lia um livro do Poeta espanhol Rafael Alberti, “Marinero em Terra” (Marinheiro na Terra), coisa lá do ano de 1924. Daqueles tempos já modernos, mas muito sedutor. Furto uma estrofe do “Prologo” do livro:
“Sueño en ser almirante de navío,/ para partir el lomo de los mares/ al sol ardiente y a la luna fría.” (Algo como dizer: “Sonho em ser almirante de navio, para romper o lombo dos mares ao sol ardente e sob a lua fria.”)
Sou de uma geração que sonhava mais. Nós almejávamos mais. Talvez não tenhamos feito bem, mas sei que muitos tentamos.
Ah, como sinto falta de gente que queira ser algo mais, gente que queira fazer seu tanto a mais, por mais gente no nosso mundo. Olho em volta, sei que temos de permitir o mundo avançar. Por que os que sonham são infelizes impedidos? Olhemos a nossa volta...
Já que estou com ele, vou dividir mais Alberti com vocês:
“Ya está flotando el cuerpo de la aurora/ em lá bandeja azul del oceano/ y la cara del cielo se colore// de carmin.” (Mais ou menos assim: “Já está flutuando o corpo da aurora na bandeja azul do oceano e a cara do céu se colore de vermelho”.)
Pois temos muito de lutar. Temos de buscar mudar o que se passa conosco frente ao mundo que nos rodeia, como se fosse frente ao mar. Mas... e o que sabemos mesmo de nós? Será que sabemos tudo o que podemos? Será que podemos o que sabemos? Será que nos vemos como de fato somos?
Ainda Alberti nos indica em metáfora suave, assim frente ao mar, o quanto nem sabemos quem somos nós e o quanto nos transformamos ante os demais. Ele diz no seu Poema “Nana”:
“Mar, aunque soy hijo tuyo/ quiero decirte: Hija mia!” (Ainda que seja filho teu, quero dizer-te: Filha minha!”
O fato é que queremos tudo, fazer tudo, sermos tudo, ou quase tudo, para realizarmos o que desejamos.
Fiquei pensando em coisas que já senti. Se temos esse muito a fazer é porque queremos ver mesmo um mundo melhor. Com certeza, é muito provável que tenhamos de altrapassarmos os limites regulares. Sermos piratas?
E nos contradizemos tanto. Isso porque, por vezes fazemos diferente do que na verdade queremos fazer, por nos colocarmos em condições diversas do que desejamos ou necessitamos. Lá diz o Poeta ainda: “me perdi en la tierra,/ fuera de la mar.”(Me perdi em terra, fora do mar.”)
É nesse tanto que Alberti nos sintetiza: “Ya era Yo lo que no era.”(“Já era eu o que não era”).
Podemos?