Colunista

A história das Coisas

27 ABR 2017 • POR • 08h00

Nesta semana revi o documentário "A história das Coisas", escrito, produzido e apresentado por Annie Leonard em 2005. No início do documentário, sua apresentadora envolve o ouvinte e espectador ao dizer que em determinado momento de sua vida foi pesquisar de onde vinha seu amor pelas coisas que possuía. Nesse caso, coisa não é um jeito brincalhão de chamar pessoas queridas, mas uma forma para designar bens de consumo descartáveis como as quinquilharias eletroeletrônicas. O documentário é um esforço para responder à seguinte questão: onde vem e para onde vão essas coisas por nós consumidas? Para responder a esta questão, Annie Leonard passou 10 anos fazendo pesquisas viajando pelo mundo. No documentário, Annie Leonard apresenta o processo de deslocamento das coisas ao longo do sistema, desde a extração dos recursos naturais, passando pelo seu processamento e a produção do bem a ser consumido, sua distribuição, consumo e descarte; e revela, neste longo processo, uma lógica linear incongruente com um Planeta finito que demanda uma lógica circular; revela também um elemento invisível e fundamental ao longo do processo chamado pessoa, gente, ser humano. A extração é apresentada como derrubada de árvores, destruição dos cerrados e dos pântanos, bombardeamento da terra para retirada de metais, desvio de rios para o represamento das águas para geração de energia, contaminação dos aquíferos, poluição dos mares e extermínio dos animais. Em seguida, ao tratar do processamento e da produção, Annie Leonard diz que, misturado aos recursos naturais, há consumo de energia e introdução de mais de 100 mil tipos de produtos químicos sintéticos que jamais foram analisados em termos de sua interação uns com os outros e seus impactos no organismo humano. Nos EUA eram utilizados na ocasião da produção do documentário 1,8 milhão de quilos de insumos tóxicos por ano. Esse tóxico é espalhado pelo planeta, mas tem impacto concentrado nos trabalhadores que lidam diretamente com eles. A apresentadora, então, trata do preço baixo dos produtos que saem das fábricas e são distribuídos. Ela conta que comprou um rádio de pilha por US$4,99 e que este preço não refletia seu custo ao considerar o metal provavelmente extraído da África do Sul, o petróleo do Iraque, o plástico da China e a montagem do aparelho com trabalho infantil no México, além do transporte por navios e caminhões e o aluguel da loja que disponibilizava o produto. Portanto, quem pagou pelo rádio? O planeta e os trabalhadores. É essa forma de exploração que viabiliza a distribuição em grande escala. Em seguida, a apresentadora trata o consumo como coração do sistema e diz que atualmente um americano médio consome o dobro do que consumia há 50 anos e que 99% do que é consumido vira lixo em menos de 6 meses. Esse excesso de consumo é deliberado. Finalmente, o lixo: nos EUA cada americano gera 2 quilos de lixo por dia, dispostos ou em aterros que contaminam a terra e a água ou é incinerado e, então, os tóxicos introduzidos nos produtos são liberados na forma de dioxina. Diante do exposto, a apresentadora diz que reciclar não adianta por que a cada saco de lixo gerado e disposto em aterros ou incinerado outros 70 sacos de lixo foram gerados ao longo do processo de produção. Vivemos tempos sombrios e o Brasil parece subordinado e disposto a explorar seus recursos naturais de forma insustentável e deixar seus trabalhadores à míngua haja vista as propostas de reforma trabalhista e previdenciária que se anunciam.