Em 22 de fevereiro de 1993, ou seja, há pouco mais de 30 anos, Sabine Werth criou o primeiro Banco de Alimentos da Alemanha, chamado Tafel (távola, em alemão) que se institucionalizou como Associação Sem Fins Lucrativos. Atualmente são 963 Bancos de Alimentos Tafel em toda Alemanha, 2,7 mil voluntários, e mais de 2 milhões de visitas por ano (usuários frequentes e esporádicos). O Tafel não recebe recursos governamentais porque não quer que a solidariedade com financiamento, subvenção, subsídio do Estado sirva de argumento para "terceirizar" serviços governamentais ou para desmontar o estado de bem estar social.
Além da ideia de solidariedade que rege a ação, pode-se dizer que o Tafel também é regido pelo princípio da redistribuição, uma vez que seus voluntários cadastram e buscam os alimentos nos setores sociais que os tem como supermercados varejistas, armazenando-os e redistribuindo-os. Assim, por um lado evita o desperdício e por outro lado garante alimento para os socialmente mais vulneráveis. Na Alemanha a pobreza, que atinge cada vez mais pessoas a cada ano, ainda não é absoluta, e o Banco de Alimentos como ação pública auxilia na "descompressão" do orçamento das famílias que podem usar parte de suas rendas que outrora serviam para a compra de alimentos para adquirir outros bens primários como roupas e material escolar.
Os beneficiários do Banco de Alimentos são diversos, desde sem teto até refugiados, passando por pais e mães solteiras e aposentados com poucos recursos financeiros e para usufruir do Tafel com todos os seus ingredientes como pães, frutas, frios, dentre outros, as pessoas precisam comprovar que têm necessidade apresentando por exemplo um documento da previdência social. O número de usuários vem aumentando, nos últimos anos (aumento de 500 mil usuários ao longo dos últimos 5 anos), principalmente depois da COVID, da continuidade da Guerra da Rússia com a Ucrânia e do aumento da inflação.
Nem tudo é mar de rosas. Os desafios são enormes, dentre os quais lidar com o aumento da pobreza relativa e com a legislação e a burocratização para permitir a doação de alimentos.
A experiência alemã auxilia-nos a refletir sobre determinados aspectos da vida em sociedade, dentre os quais:
" O chamado terceiro setor que comporta as Associações Sem Fins Lucrativos na Alemanha independe do Estado do ponto de vista financeiro e procura fortalece-lo como garantidor de Direitos;
" Os "voluntários" produzem dados, informações e conhecimento a partir da prática cotidiana lidando com a fome e a pobreza e pressionam o governo para agir no sentido de fortalecer o estado do bem estar social;
" A ação iniciada no local expandiu-se para uma ação em rede, articulada em todo o país a partir de poucos princípios de ação.
Enfim, o principal aprendizado é que a solidariedade que se basta no gesto da caridade é importante mas insuficiente; a verdadeira caridade é aquela que também denuncia e pressiona para remover os entraves que geram as injustiças.



