"Chegar à velhice é muito melhor do que não chegar." O aforismo gaiato é de Zuenir Ventura, mas poderia ser de Luis Fernando Verissimo ou de Ziraldo. Os três amigos, de 83, 82 e 78 anos, encaram a passagem do tempo com a mesma serenidade, e sem cair nas armadilhas do saudosismo. Juntos, escreveram o ponto de partida de “BarbarIdade”, comédia musical que estreou na última quinta-feira, no Teatro Oi Casa Grande, no Rio. Acabaram inspirando personagens do texto de Rodrigo Nogueira, o autor (também dos musicais sobre o Rock in Rio e sobre Chacrinha, que precederam BarbarIdade). No espetáculo, metalinguístico, três autores, vividos por Osmar Prado, Edwin Luisi e Marcos Oliveira, tentam escrever um espetáculo sobre a velhice, mas sofrem um bloqueio criativo. "A Aniela (Jordan, produtora) me convidou para escrever a peça e eu chamei os dois para esse menage à trois", brinca Zuenir. "Nós três temos uma visão otimista do tema, nosso lema é o ‘carpe diem’, que significa não olhar para trás nem fazer planos para o futuro. Nunca fomos de falar ‘no meu tempo...’. O problema não é a velhice, e sim a falta de saúde. O Ziraldo tem sete stents (no coração), o Verissimo toma 21 comprimidos por dia, eu tomo seis. E nunca fui tão feliz. Os maiores inimigos da velhice são as pedras portuguesas e as escadas." A premissa é de que a tal "bárbara idade", por ser livre de pudores, pode, sim, ter sua graça. E outra: que a proximidade maior da morte não deve ser uma ameaça à felicidade - Verissimo goza: "A morte é a última coisa que eu quero para mim". O texto foge dos clichês e das figuras caricatas do "velhinho fofinho" e do rabugento. Susana Vieira, aos 72 anos símbolo da maturidade com vitalidade, é a protagonista: uma produtora que odeia velhos e que, vítima de si mesma, termina por assumir o próprio desconforto com a idade. "Não me identifico em nada. Ela é muito preocupada com a idade, que é uma coisa com a qual eu não me preocupo, porque eu estou muito bem. Estou com a idade que estou e estou no palco protagonizando BarbarIdade", diz a atriz. Em cinco décadas de carreira, é seu primeiro musical. Edwin Luisi também nunca havia experimentado o gênero. Osmar Prado já participou de espetáculos como Quem Casa Quer Casa e A Pequena Loja dos Horrores, nos anos 1980, e nunca deixou de exercitar a voz. "Sou um ator que canta, me sinto voando, fisicamente e psicologicamente. Tenho 67 anos e estou usando toda a minha potencialidade. A velhice é um tabu, a sociedade é perversa e tenta empurrar o idoso para o caixão. Mas ando de moto todo dia, faço pilates." Rodrigo Nogueira buscou dosar a comédia e o tom reflexivo, o riso e a ternura, a momentos de melancolia. A nostalgia é embalada por músicas do repertório de Frank Sinatra, e é quebrada por Anitta. "O velho não vive essa velhice que a gente vê", aponta o autor, que resgatou da memória afetiva os timbres dos três autores. "Li os três a vida toda, o Ziraldo na infância, o Verissimo na adolescência e o Zuenir, adulto. Por ser mais novo (40 anos), tentei olhar através dos olhos deles. Entendi que se no teatro você pode ser tudo o que você quiser, na velhice também pode." São 18 em cena. O diretor é Alonso Barros. Os ensaios duraram dois meses; antes, a equipe teve conversas com a antropóloga Mirian Goldenberg, autora de estudos sobre o envelhecimento no Brasil.