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Jornal Diário de Suzano - 26/07/2024
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Coluna

Sobre Lixo, Lixeiras e Lixeiros

11 fevereiro 2021 - 05h00
Certa vez ouvi uma definição de que lixo é "qualquer produto usado e descartado no lugar errado".
Então para reduzir o lixo, é preciso refletir antes de se consumir: é possível usar algo já utilizado no lugar do novo produto que se deseja comprar? Eis o princípio do reuso. Em seguida, se o consumo for realmente imprescindível, o questionamento recai sobre a quantidade a ser consumida. Eis o princípio da redução.
Tanto para reduzir quanto para reusar há uma série de dilemas. O reusar muitas vezes significa aproveitar o caderno do ano passado, a roupa do irmão mais velho, do vizinho, primo, colega. No entanto, não parece que esse ato seja apreciado na sociedade de consumo. O reuso nessa medida implica na mudança radical de hábitos. O reduzir, por sua vez, implica em luta sem trégua ao marketing que busca convencer-nos a consumir o que não precisamos.
Depois de reduzir e reutilizar, no ato pós-consumo, deve-se pensar no reciclar. Ao considerar que 50% dos resíduos sólidos urbanos são orgânicos, o primeiro passo é separar o orgânico dos outros resíduos que facilmente pode transformar-se em composto orgânico e voltar para a terra; o restante é dividido em recicláveis e inservíveis: os recicláveis podem ser bem acondicionados e entregues em cooperativas na ausência de um serviço público municipal decente de coleta seletiva; os inservíveis serão descartados e terão o aterro sanitário como destino. Parcela imensa do inservível é embalagem geralmente de plástico. 
Essa relação com o lixo é refletida de forma muito filosófica pelo escritor Ítalo Calvino no conto "La poubelle agréée". Neste conto que vale ser lido em sua íntegra destaco duas passagens:
A primeira é sobre o poder de regulação do Estado para padronizar lixeiras, transporte, transbordo, destino do resíduo bem como a política de reciclagem e nesse aspecto diz o autor que "a reforma que se anuncia como mais necessária e urgente será a da separação do lixo conforme suas qualidades e os diversos destinos, incineração ou reciclagem, para que ao menos parte do que arrancamos dos tesouros do mundo não se perca para sempre, mas reencontre os caminhos da recuperação e do reaproveitamento; o eterno retorno do efêmero".
A segunda é sobre o lixeiro, aquele "que se ergue até a boca da moenda malcheirosa na bruma da manhã, e essa moenda não seria só a última etapa do processo industrial de produção e destruição, mas marcaria ainda o ponto de onde se recomeça desde o início, o ingresso para um sistema que deglute os homens e os refaz à própria imagem e semelhança".
Essa reflexão é marcante na medida em que nos chama a refletir sobre o destino do lixo gerado do tesouro do mundo, do homem consumidor, do homem trabalhador, do homem moído nesse sistema.
Assim, essa reflexão nos toca como indivíduo geradores de lixo e nos toca também como cidadãos eleitores para que chamemos a atenção dos eleitos, prefeitos e vereadores, no que tange a política de resíduos sólidos no âmbito do município para zelarem pelo trabalho decente de garis e lixeiros, pela regulação do sistema de coleta, transporte, transbordo e destino do resíduo, pelo fortalecimento de cooperativas de catadores reconhecidas como prestadoras de serviço, pelas campanhas educativas em prol da redução, reuso e reciclagem dos produtos que, por desleixo e descuido, podem tornar-se lixo.