Tem coisas boas, tão boas, na vida da gente, e de que tantas vezes nem nos damos conta, que em algumas oportunidades devemos, sim, destacar e deixar registrado. Hoje alguém me perguntou se eu “ainda” tinha mãe. Esse “ainda” foi dito, com toda a certeza, em razão da minha idade. E, sem pensar muito, respondi: “Não, não tenho mais a minha mãe”. Depois, estava lá, pensando com os meus botões, sobre o que havia dito. Eu não perdi a minha mãe. Mãe não nos escapa por entre os dedos. Ela está ali, dentro de mim. Sabia, como sempre soube, que ela estava na minha mente, racional, no meu pensamento. Sabia que ela estava no meu coração emocionado. A magia da sua presença vincava ainda, por demais, os meus atos. Aprendi tanto com ela. Minha mãe estava ali, talvez como algo muito mais marcante, algo como naquele verso da música americana, “deep in a dream”, “no fundo, no profundo, do (meu) sonho”. Ninguém “perde” a mãe. Ou a gente se perde, quando a gente se engana da rota que seguia, que talvez devesse seguir, ou ela fica na gente. E seguimos repetindo aquelas palavras que ela nos dizia, e que por vezes nos incomodavam quando éramos pequenos, e que vamos reproduzindo para os nossos filhos. Tive a felicidade de ter família constituída, com pai e mãe presentes, atentos. Talvez até isso tenha me provocado a vontade de repeti-los. E o exemplo de minha mãe foi determinante em tantos passos da minha vida, alguns que ainda hoje não deixo de repetir, mesmo que distraído de sua origem. E sei que não sou diferente. Quem teve essa felicidade, do exemplo materno, não o abandona. Ah, que foram tantas as vezes em que me dei conta de estar repetindo atitudes de minha mãe, que aprendi com ela, sem que mesmo me apercebesse. Talvez não tenha feito tantos poemas como ela merecesse, mas trago alguns versos, na pretensão de marcar um modelo que pode servir a tantos. Eis o poema “Os Olhos”: “os olhos de minha mãe sempre/ indicavam caminhos/ nas noites dos seus olhos/ brilhavam luas incandescentes/ de prata ficavam os mares/ nas rotas que me escolhi/ sei como sabia que não ia me perder/ nas coisas que não sabia/ teria o colo e suas mãos/ afagos e balanços/ segurança e perdão”// “os olhos de minha mãe brilhavam/ o dia que um dia vai chegar/ fundos como cavernas/ protetoras do frio/ do vento ou do espinho/ chegavam lindos de cores/ como as flores da alegria/ domavam o triste/ afastavam a solidão/ rendavam de luzes ternas as ruas/ da infância eterna que me guia”
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Suami Paula de Azevedo