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Jornal Diário de Suzano - 05/05/2024
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Coluna

A atualidade da Geografia da Fome de Josué de Castro

14 setembro 2023 - 05h00

A Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional - Rede Penssan - apresentou, em 2022, uma pesquisa em que revelou que a fome, forma mais grave da insegurança alimentar, atingia 15,5% dos brasileiros, o que representava 33,1 milhões da população nacional. A insegurança alimentar leve e moderada atingia mais de 40% da população. O conjunto da insegurança alimentar leve, moderada e grave chegava a aproximadamente 60% da população, ou seja, mais de 120 milhões de pessoas passavam fome ou algum tipo de incerteza quanto à obtenção de alimentos no futuro próximo ou limitação na qualidade de sua dieta ou restrição na quantidade de alimentos.
Esses dados indicam que a fome, expressão orgânica de um fenômeno político e social, denunciada em 1946 no livro "Geografia da Fome" de Josué de Castro (1908-1973) continua atual.
O autor, de formação interdisciplinar, lança mão de um conjunto amplo de conhecimentos para apresentar a fome não somente como um fenômeno fisiológico mas antes de mais nada como um fenômeno político.
Nessa medida, o autor associava as cinco paisagens nacionais aos hábitos alimentares específicos das populações e também às características do clima, do solo de da vegetação regionais, bem como à estrutura agrária e às relações de trabalho.
Assim, no extremo sul do país o autor identificava maior consumo de frutas e verduras ao mesmo tempo em que as crianças pobres dos grandes centros urbanos apresentavam carência de proteína.
Na paisagem amazônica, o autor identificava por um lado a cultura indígena e por outro o povoamento dispersivo, em que havia predominância do consumo de farinha de mandioca e ausência de carne, frutas, leite, ovos e verdura e a consequente deficiência nutritiva.
O Nordeste açucareiro era caracterizado pela destruição da mata nativa, pela monocultura da cana-de-açúcar em latifúndios e o consequente empobrecimento do solo, perda de biodiversidade, relações precárias de trabalho, e empobrecimento da alimentação.
No Sertão nordestino a fome aparecia com os períodos de seca. Apesar do predomínio do milho, havia também carne e leite diversos (bois, cabras e carneiros).
No Centro-Oeste a dieta era baseada no milho, no feijão e na carne expressas no "tutu de feijão" à base de farinha de milho, feijão de gordura, rico em caloria e pobre em nutrientes.
O diagnóstico da fome ainda recrudescente foi feito nos anos 40. Josué de Castro à frente de seu tempo, ao fazer o diagnóstico, estava articulando os diferentes aspectos ambientais, culturais, econômicas, políticas e sociais. Resta-nos pensar na superação do referido problema, a partir dos múltiplos aspectos já mobilizados pelo autor e pela ação da sociedade e do governo nos âmbitos federal mas também estadual e municipal. Que o tema da fome e suas múltiplas interfaces temáticas permaneçam nas agendas de governo e de lutas sociais.