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Jornal Diário de Suzano - 05/05/2024
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Coluna

Que a várzea não vire aterro! Que a várzea se recupere!

21 setembro 2023 - 05h00

As várzeas de rios são as áreas marginais de seus leitos inundadas de tempos em tempos em decorrência do maior fluxo de água, geralmente decorrente das chuvas. Segundo Juliana Delgado (2020), em artigo publicado na Revista Confins, "as várzeas têm a função de atuar como terrenos inundáveis, constituindo-se mecanismos de contenção e drenagem na medida em que possibilitam a retenção de água e controlam a velocidade de escoamento do rio em épocas de cheia". Nos períodos de estiagem podem servir de áreas de lazer: daí os campos de futebol de várzea. Em Suzano, as várzeas do Rio Guaió praticamente acabaram. As várzeas do Rio Tietê e todo seu complexo, pouco a pouco, vão cedendo espaço para a consolidação de bairros e mais recentemente cede lugar a um aterro de inertes e de resíduos da construção civil. Apesar de todas as autorizações, esses resíduos, além de aterrarem a várzea, um "piscinão natural", podem, eventualmente, conter produtos tóxicos e perigosos à saúde humana. Neste sentido, vale lembrar que em outras ocasiões, por ordem da CETESB, áreas como a USP-Leste foram interditadas por receberem material inerte e resíduos da construção civil e o consequente risco desse material à saúde humana.
O fato é que em Suzano, o aterro avançou a passos largos. Há um movimento social organizado que busca reverter a situação chamado "Movimento de Defesa da APA do Rio Tietê". Este movimento tem cumprido importante papel de mobilizar a população do entorno, denunciar o aterro e comunicar suas denúncias. Não vejo os órgãos de governo vinculados aos três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) comunicando a população quanto a seus atos, decisões, argumentos e alimentando o debate, fundamental na democracia.
A imprensa, por sua vez, tem cumprido relevante papel de garantir voz aos diversos atores. Foi por meio da imprensa local (Diário de Suzano, 21 de agosto de 2023) que me deparei com a posição da prefeitura de Suzano que, amparada em documentos da CETESB e da Fundação Florestal justifica o descalabro ambiental e afirma que "a realização do aterro de inertes não depende de autorização da administração municipal". Diante do argumento da prefeitura lembro-me imediatamente de dois ensinamentos: Justiça e Direito. Em "Introdução à Ciência do Direito" o governador e professor André Franco Montoro pontua que nem sempre o Direito e suas normas estão amparados em um sentido de justiça. Assim, argumentar simplesmente a partir de pareceres da CETESB e da Fundação Florestal é tão-somente uma forma de defender o status quo em detrimento de um sentido de justiça que sustenta os Direitos Humanos da população do entorno e do direito difuso ao meio ambienta para a geração presente e para as gerações futuras;
Lavar as Mãos. Ao afirmar que "o aterro não depende de autorização da administração municipal", a prefeitura lava suas mãos como o fez há dois milênios Poncio Pilatos, demonstrando fraqueza diante dos "senhores da Lei" que naquela situação influenciou o povo. Na ocasião, ao lavar as mãos, amparado nas normas e na tradição, o representante romano "assassinou" um justo.
Bruno Latour, no livro "Onde aterrar", afirma que pela negação das mudanças climáticas o presidente dos Estados Unidos Donald Trump pôs o ambientalismo na agenda política. 
Em Suzano, pelas denúncias dos movimentos sociais por um lado, e pela negação da justiça ambiental por outro, a prefeitura também põe o meio ambiente na agenda política. Mas nem tudo está perdido. Com apoio da SABESP, detentora de áreas no entorno, e com apoio do Consórcio Intermunicipal, fundamentalmente de Poá e Itaquaquecetuba, quem sabe a Prefeitura de Suzano não apoie a interrupção imediata do aterro e inicie projeto de um Parque Ecológico Intermunicipal. Que a várzea não vire aterro. Que a várzea se recupere. Fica a proposta!