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Jornal Diário de Suzano - 25/04/2024
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Coluna

Os Dizeres

16 janeiro 2021 - 05h00
Talvez tenha muita coisa sendo dita sem ter sido pensada, sem ter sido sentida. Vamos percebendo que essas coisas soltas no espaço acabam incomodando mais adiante. 
Estava pensando nisso, quando caiu-me nas mãos um poema que escrevi há uns dez anos. Isso me levou a refletir sobre essa coisa de dizermos sem maior reflexão, sem pensarmos no quanto e como podem chegar aos demais. As coisas vão passando, vão se repetindo, nem sempre atentamos para isso, e tantas vezes somos surpreendidos por nós mesmos. Ou, como vemos se estender a nossa frente, uns tantos nem se apercebem.
Como professor aprendi (só para lembrar: professor sempre aprende cada vez que ensina. Ou nada ensinou...) muitas coisas ao atentar para o mundo, com as suas pessoas, as suas maneiras de viver, as suas maneiras de perceber. Mas sei que foi como artista, como poeta, que consegui interpretar o tanto desse mundo que nos afeta. O poeta é, necessariamente, um ser sensível. Ele deve se disponibilizar ante tudo. Assim, colocarmo-nos sensíveis ante as coisas, ante as pessoas e suas maneiras, abre-nos chances de receber mais do que nos é oferecido. Podemos ir bem mais adiante.
Sei que nem todos se abrem ao mundo. Muitos não atentam para os que os ouvem, para os que os veem. E não me refiro apenas aos nossos vizinhos, aos nossos colegas. Vejo autoridades, lideranças que mostram não reconhecer, ou não aceitar os que os demais nos mostram receber, mesmo de nós.
Não seria importante nos colocarmos em interrogações ante o que se passa a nossa frente? Por que não? 
Vejam o que nos provoca esse poema, que realizei lá por outubro de 2011, chama-se: "Dito":
"quando escrevo o que altero?// 
onde a originalidade/ num universo há tanto perpetrado?//
o que se move ante minha fala/ quando a digo?//
a palavra apenas descreve o universo/ ou por ela é recriado?//
ou digo apenas o que do meu olhar escapa?" 
Sei bem que é o leitor quem explica o que dizem os versos, o que eles querem dizer. Mas tentemos juntos chegar ao que nos atinge.
Será mesmo que o poeta altera o mundo com o que diz? Ou será que cada um de nós, concretamente, altera o mundo? Ou, somos tão pouco perceptíveis que não nos damos conta do quanto afetamos os demais? 
E num mundo tão afetando por tantos, será que consigo chegar a oferecer algo novo? E será que só o novo afeta?
Será que percebo onde afetei os demais, ou nem me toco se isso acontece?
E o que digo pode transformar ou nada alcança?
Será que a minha fala só expressa a limitação do meu olhar? Ou o mundo segue bem mais adiante de mim e do que percebo? 
Importa podemos nos entender?
E para encerrar, trago mais um poema meu. Nestes tempos escuros, o poema se chama "Brumas":
"saber é tão lento/ mas todos os dias agradeço/ cada nova oportunidade de aprender/ como um professor também/ vai aprendendo devagar a ser mestre/ um aluno leva seu tempo a descobrir/ ouvir e ver e entender o ensinado/ levei meu tempo mas aprendi/ que se a noite foi escura/ e se a manhã se desperta em brumas/ podemos ter certeza de que o sol vai brilhar/ forte e cheio de calor em nossa vida"